O sertão vai virar mar: a usina hidrelétrica de Sobradinho e seus impactos ambientais (1971-1981)voltar para a edição atual

DANIEL SEIDEL DA SILVA

Sob orientação de Dominichi Miranda de Sá e INGRID FONSECA CASAZZA
O Rio São Francisco tem sua nascente localizada em Minas Gerais e deságua na divisa entre Alagoas e Sergipe, após banhar outros Estados. A região do Rio São Francisco é atualmente palco de grave crise ecológica e de série de conflitos pelo uso da água que inclui acesso limitado das populações locais a este recurso. É um dos ecossistemas que mais sofreu intervenções a partir da segunda metade do século XX no país e foi foco de projetos modernizadores que conduziram um processo de reconfiguração das paisagens locais, que ocasionou impactos ambientais e sanitários. Um dos mais importantes projetos de modernização em regiões e países em desenvolvimento, neste período que a historiografia chama de Grande Aceleração, foram barragens e hidrelétricas (Oliveira, 2018). Grande Aceleração é um conceito que vem sendo debatido nas ciências humanas e sociais e representa os anos após a Segunda Guerra Mundial em que foram internacionalmente compartilhados modelos de desenvolvimento calcados no aumento do consumo de bens, recursos e energia. Esse aumento súbito e exponencial da exploração de recursos naturais provocou uma intensificação do impacto das ações humanas nos processos biogeoquímicos do planeta (McNeil & Engelke, 2014). O objetivo deste projeto de pesquisa é realizar uma análise histórica da construção da Usina Hidrelétrica de Sobradinho na década de 1970, no trecho médio do Rio são Francisco, inserida neste contexto da Grande Aceleração. A ideia é compreender as formas pelas quais projetos, como a Hidrelétrica de Sobradinho e seus objetivos principais, neste caso a produção de energia elétrica, contribuíram para a situação conflituosa na qual se encontra hoje a região do vale do rio São Francisco. O recorte cronológico deste projeto, 1971-1981, refere-se ao período de construção da usina hidrelétrica. No entanto, pode ser estendido na análise uma vez que seus efeitos são duradouros, ainda estão em curso e a hidrelétrica encontra-se em atividade. A metodologia consiste na abordagem das fontes históricas a partir de articulação entre questões da história ambiental e da história da saúde. O trabalho compreende pesquisa bibliográfica e levantamento documental. Apesar do desenvolvimento da historiografia ambiental sobre o Brasil, a literatura sobre corpos hídricos, considerada sob um ponto de vista histórico, ainda é escassa. Pouco foi escrito sobre o papel desempenhado pela água em projetos de modernização focados na produção de energia e como um indicador do impacto das mudanças induzidas pelo homem em diferentes ecossistemas. Faltam estudos relacionando as políticas de desenvolvimento do Brasil no século XX e a transformação de sistemas hídricos do país e, principalmente, analisando os impactos sanitários decorrentes destas transformações. Uma historiografia recente tem demonstrado que a articulação entre história da saúde e a história ambiental, tal como esse projeto propõe, é fundamental para compreender as transformações ambientais decorrentes de modelos de desenvolvimento e a dimensão ecológica e social destes processos (Mitman, Murphy & Sellers, 2004; Anderson, 2004; Nash, 2006; Carter, 2007). A análise da Usina Hidrelétrica de Sobradinho, inserida no contexto dos projetos modernizadores que foram implementados na região a partir da década de 1940, a partir da abordagem da história ambiental em diálogo com a história das ciências e da saúde, contribui tanto com a historiografia como para o entendimento da crise hídrica atual e dos conflitos em torno dos usos da água na região do Vale do São Francisco.
Palavras-chaves:ÁGUADESENVOLVIMENTOCIÊNCIASAÚDE Área de conhecimento (CNPq): História Linha de pesquisa na FIOCRUZ: 23.6. Concepções e práticas científicas e intelectuais sobre natureza e ambiente